Gosto e assisto muito aos canais educativos de TV a cabo que passam documentários sobre tecnologia, fábricas, tendências etc. Dias destes, revi um que era dedicado ao veículo do futuro. O documentário foi feito por uma montadora americana e, nele, alguns jovens designers participaram de um workshop interno no qual deveriam expor sua concepção do que deveria ser o carro que está por vir. Foram apresentadas idéias mirabolantes para o meio de transporte do futuro, algumas até interessantes mas outras, embora geniais, com filosofia bastante discutível.
Dentre as interessantes, a idéia de fazer um veículo “macio” para não machucar os pedestres num eventual atropelamento. A idéia é pertinente e várias montadoras já estão trabalhando nisso. Algumas delas, como eliminação do quebramato em veículos fora de estrada e capô articulável para absorver e diminuir o impacto do corpo já estão em prática há tempos.
Outros projetos apresentados defendiam a idéia de veículos coletivos. Um ou mais designers são adeptos da idéia de que carros devem ser compartilhados por todos, algo como metrô ou ônibus. As soluções técnicas de como fazer o sistema realmente são coisas de quem pensou muito: os veículos ficariam numa espécie de estacionamento público, pendurados em ganchos como carne em açougue. Teriam sistemas de memória para que, assim que o usuário se identificasse eletronicamente, o veículo alteraria todas as suas regulagens ao gosto particular; sistema de retração no comprimento do veículo para ocupar menos espaço quando estacionado etc. Ao fim do uso, o veículo deveria ser devolvido ao uso público para que outra pessoa pudesse usá-lo.
Tudo lindo, só esqueceram que o ser humano é individualista por natureza. A idéia de compartilhar sua propriedade com o vizinho, olhando os fatos de um passado recente, já sabemos que não funciona, não é mesmo? O mundo inteiro mudou e percebeu que cada um quer que suas coisas tenham a sua identidade, seu gosto particular e sejam sua propriedade. Do telefone celular, passando pelos computadores, até tênis, tudo hoje em dia é “customizável” e permite que seu futuro dono estampe sua marca pessoal para mostrar “este sou eu”.
Basta lembrar a febre que foi o tuning. Embora com exageros típicos da liberdade total de expressão e resultados pra lá de discutíveis, foi a faísca que fez os fabricantes perceberem que cada um queria mostrar qual era a sua interpretação do gosto pessoal.
Pequenos fabricantes de carros espalhados pelo mundo, inclusive, praticamente personalizam 100% da produção. Pintura externa, interna, estofamento, motores, o que e onde colocar, tudo fica ao gosto do cliente.
A própria Harley-Davidson, tradicionalíssima fabricante americana de motos, depois de tentar a padronização em massa e passar por dificuldades no passado, entendeu que personalizar era uma das saídas. Criou uma linha de produção paralela à linha normal, para que alguns clientes especiais tenham Harley que nenhum outro terá. Pintura exclusiva feita à mão (!), estofamento com forro diferenciado, acessórios únicos, entre outros. Tudo para que o cliente diga: “esta é a moto que EU escolhi”.
Um outro problema desta “socialização” do carro como bem público seria a manutenção: se já sendo propriedade particular boa parte dos donos não cuida de seus carros, imaginem a população inteira usando um veículo sem dono?
Enfim, há muita gente competente no mundo do design, muitas idéias criativas e apaixonantes. Sem dúvida, é isso que necessitamos para que o mundo ande. É natural que, entre muitas idéias, umas poucas se aproveitem e a maioria seja descartada.
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