terça-feira, 24 de março de 2015

Harley Davidson - A história


  

 A lendária Harley-Davidson é muito mais do que um ícone da cultura norte-americana. É, certamente, o mais tradicional e um dos maiores fabricantes de motocicletas do mundo na atualidade. A empresa, que hoje possui três grandes fábricas nos Estados Unidos, emprega diretamente cerca de nove mil trabalhadores e deverá atingir uma produção de quase 300 mil motos neste ano. São números expressivos, que escondem um início modesto e repleto de desafios.

A história da marca começou em 1903, num barracão localizado nos fundos da casa dos jovens irmãos Arthur e Walter Davidson, no município de Milwaukee, em Wisconsin. A dupla, que tinha em torno de 20 anos, acabava de se associar com William S. Harley, de 21 anos, para construir artesanalmente um pequeno modelo de motocicleta destinado às competições. Foi neste barracão (com três metros de largura por nove metros de comprimento), e em cuja fachada podia se ler o letreiro “Harley-Davidson Motor Company”, que foram produzidas as primeiras três motocicletas da marca.

Dessas três motocicletas iniciais, uma foi vendida diretamente pelos fundadores da empresa, em Milwaukee, para Henry Meyer, amigo pessoal de William S. Harley e Arthur Davidson. Em Chicago, a primeira concessionária nomeada pela marca – C. H. Lang – comercializou outra dessas três motos fabricadas inicialmente.
Os negócios começavam a evoluir, mas num ritmo lento. No dia 4 de julho de 1905, no entanto, uma motocicleta Harley-Davidson venceu, em Chicago, sua primeira competição – e isso ajudou a alavancar ainda mais as vendas da jovem empresa. Neste mesmo ano, foi contratado, em Milwaukee, o primeiro funcionário em tempo integral da Harley-Davidson Motor Company.
No ano seguinte, com as vendas em ascensão, seus fundadores decidiram abandonar as instalações iniciais e se instalaram num armazém muito maior, com melhores condições de trabalho, localizado na Juneau Avenue (avenida Juneau), em Milwaukee. Mais cinco funcionários foram contratados para trabalhar lá em tempo integral. Ainda em 1906, a marca produziu o seu primeiro catálogo promocional.
Em 1907, mais um Davidson junta-se ao negócio. William A. Davidson, irmão de Arthur e Walter, pede demissão do seu emprego e também passa a trabalhar na Harley-Davidson Motor Company. Ainda neste ano, o número de funcionários e a área de trabalho da fábrica praticamente foram dobrados. Um ano depois foi vendida a primeira motocicleta para a polícia de Detroit, dando início a uma parceria tradicional, que sobrevive até os dias de hoje.
Em 1909, a Harley-Davidson Motor Company, então com seis anos de vida, apresenta a sua primeira grande evolução tecnológica no mercado de duas rodas. O mundo assistiu ao nascimento do primeiro motor V-Twin montado em motocicletas, um propulsor capaz de desenvolver 7 cv – uma potência considerável para aquela época. Em pouco tempo, a imagem de um propulsor com dois cilindros dispostos num ângulo de 45 graus tornou-se um dos ícones da história da Harley-Davidson.
Em 1912, foi iniciada a construção definitiva da fábrica localizada na Juneau Avenue e inaugurada uma área exclusiva para peças e acessórios. Mesmo ano em que a empresa atingiu a marca de 200 concessionários nos Estados Unidos e exportou suas primeiras unidades para o Exterior, atingindo o mercado japonês.
Marca vendeu quase 100 mil motos para o exército
Entre 1917 e 1918, a Harley-Davidson Motor Company produziu e comercializou 17 mil motocicletas para o exército americano durante a 1a Grande Guerra Mundial. Um soldado americano pilotando uma Harley-Davidson equipada com side-car foi o primeiro a entrar em território alemão.
Por volta de 1920, com cerca de 2.000 distribuidores espalhados por 67 países, a Harley-Davidson já era a maior fabricante de motocicletas do planeta. Na mesma época, o piloto Leslie “Red” Parkhurst quebrou nada menos que 23 recordes mundiais de velocidade com uma motocicleta da marca. A Harley-Davidson foi a primeira empresa, por exemplo, a vencer uma prova de velocidade superando a marca das 100 milhas/hora.
Em 1936, a empresa introduziu o modelo EL, conhecido como “Knucklehead”, equipado com válvulas laterais. Esta moto foi considerada uma das mais importantes lançadas pela Harley-Davidson em sua história. No ano seguinte, morreu William A. Davidson, um dos fundadores da empresa. Outros dois fundadores – Walter Davidson e Bill Harley – morreriam nos próximos cinco anos.
Entre 1941 e 1945, período que durou a 2a Grande Guerra Mundial, a empresa voltou a fornecer suas motocicletas para o exército norte-americano e seus aliados. Quase toda a sua produção, calculada em torno de 90 mil unidades, foi enviada para as forças norte-americanas neste período. Um dos modelos desenvolvidos pela Harley-Davidson especialmente para a guerra foi o XA 750, que era equipado com um propulsor horizontal com cilindros opostos, destinado principalmente para uso no deserto. Foram comercializadas 1.011 unidades desse modelo para uso militar durante a guerra.

Em novembro de 1945, com o fim da guerra, foi retomada a produção de motocicletas para uso civil.  Dois anos depois, para atender a demanda crescente de motocicletas, a empresa adquire sua segunda fábrica – a planta de Capitol Drive -, em Wauwatosa, também no estado de Wisconsin. Em 1952, foi lançado o modelo Hydra-Glide, a primeira motocicleta da marca batizada com um nome – e não com números, como acontecia até então. 
A festa em homenagem aos 50 anos da marca, em 1953, não contou com três dos seus fundadores. Nas festividades, em grande estilo, foi criado um novo logo em homenagem ao motor disposto em “V”, marca registrada da empresa. Neste ano, com o fechamento da marca Indian, a Harley-Davidson tornaria-se a única fabricante de motocicletas dos Estados Unidos pelos próximos 46 anos.

O então jovem astro Elvis Presley posou para a edição de maio de 1956 da revista “Enthusiast” com uma Harley-Davidson modelo KH. Um dos modelos mais tradicionais da história da Harley-Davidson, o Sportster, foi introduzido em 1957. Até hoje, este nome desperta paixões entre os fãs da marca. Outra legenda da marca foi lançada em 1965: a Electra-Glide, substituindo o modelo Duo-Glide, e trazendo como inovação a partida elétrica – recurso que pouco tempo depois chegaria também à linha Sportster.
Fusão com a AMF ocorreu em 1969
Uma nova fase na história da Harley-Davidson teve início em 1965. Com a abertura das suas ações na Bolsa, termina o controle familiar na empresa. Como conseqüência dessa decisão, em 1969, a Harley-Davidson uniu-se com a empresa American Machine and Foundry (AMF), um tradicional fabricante norte-americano de produtos de lazer. Neste ano, a produção anual da Harley-Davidson chegou a 14 mil unidades.
Em resposta à tendência de personalização das motocicletas, em 1971, foi criada a motocicleta FX 1200 Super Glide – um modelo híbrido entre a Electra-Glide e a Sportster. Uma nova categoria de motocicletas, chamada de cruiser e destinada às longas viagens, nascia ali – um produto feito sob medida para atravessar com conforto e segurança as imensas estradas norte-americanas.
Dois anos depois, com a demanda novamente em ascensão, a Harley-Davidson tomou a decisão estratégica de ampliar sua produção, deixando a planta de Milwaukee exclusivamente para a fabricação de motores. A linha de montagem das motocicletas foi transferida para uma nova planta maior e mais moderna em York, na Pensilvânia. O modelo FXRS Low Rider juntou-se à linha de produtos Harley-Davidson em 1977.
Outro momento decisivo na história da Harley-Davidson ocorreu no dia 26 de fevereiro de 1981, quando 13 executivos seniores da empresa assinaram uma carta de intenção para comprar as ações da Harley-Davidson que pertenciam à AMF. Em junho do mesmo ano, a compra foi concretizada e a frase “The eagle soars alone” (A águia voa sozinha) se popularizava. Imediatamente, os novos proprietários da empresa implementaram novos métodos de produção e gerenciamento de qualidade na produção das motocicletas da marca.
Em 1982, a Harley-Davidson solicitou ao governo federal dos Estados Unidos a criação de uma tarifa de importação para motos com motores acima de 700 cc, com o objetivo de conter a verdadeira “invasão” de motocicletas japonesas no mercado norte-americano. O pedido foi atendido. No entanto, cinco anos depois, a empresa surpreendeu o mercado. Confiante na sua capacidade de competir com as motocicletas estrangeiras, a Harley-Davidson solicitou novamente ao governo federal que retirasse a tarifa de importação das motos importadas um ano antes do que estava programado.
Foi uma medida absolutamente inédita no país até então. A repercussão deste ato foi tão forte que levou o presidente dos Estados Unidos, Ronald Reagan, a realizar um tour pelas instalações da marca e declarar publicamente que era um fã da Harley-Davidson. Foi o suficiente para dar novo fôlego à marca.
Antes disso, porém, em 1983, foi criado o Harley Owners Group (H.O.G.), grupo de proprietários de motocicletas da marca que reúne atualmente cerca de 750 mil associados em todo o mundo. É o maior clube deste tipo do mercado de duas rodas do planeta.  No ano seguinte, foi apresentado o novo motor Evolution V-Twin, com 1.340 cc, que exigiu sete anos de pesquisa e desenvolvimento dos engenheiros da Harley-Davidson.
Este propulsor equiparia cinco motocicletas da marca já naquele ano, incluindo a novíssima Softail – outra legenda da marca. O lançamento ajudou a empresa a aumentar ainda mais as suas vendas. Como conseqüência, em 1986, as ações da Harley-Davidson entraram para a Bolsa de Valores de New York – a primeira vez desde 1969, quando havia acontecido a fusão entre a Harley-Davidson e a AMF.
Em 1991, foi introduzida a família Dyna com o modelo FXDB Sturgis. Dois anos mais tarde, perto de 100 mil motociclistas participaram da festa de 90 anos da marca, em Milwaukee. Em 1995, a Harley-Davidson introduziu a clássica FLHR Road King. O modelo Ultra Classic Electra Glide, ao comemorar seus 30 anos de existência, ainda em 1995, tornou-se a primeira motocicleta da marca a contar com injeção eletrônica seqüencial de combustível.
Em 1998, a Harley-Davidson adquiriu a Buell Motorcycle Company, abriu uma nova fábrica de motores fora de Milwaukee, na cidade de Menomonee Falls, em Wisconsin, e construiu uma nova linha de montagem em Kansas City, no Missouri. No mesmo ano, a empresa comemorou em Milwaukee seu aniversário de 95 anos, com a presença de mais de 140 mil fãs da marca na cidade.
Foi também no final de 1998 que a Harley-Davidson inaugurou sua fábrica em Manaus, no Brasil. Até hoje, é a única linha de montagem da marca instalada fora dos Estados Unidos. Nesta unidade, são montados, atualmente, os modelos Softail FX, Softail Deuce, Fat Boy, Heritage Classic, Road King Classic e Ultra Electra Glide. A nova Road King Custom começa a ser montada nesta unidade em novembro.

Em 1999, chegou ao mercado o novíssimo propulsor Twin Cam 88 nas linhas Dyna e Touring. Em 2001, a Harley-Davidson apresentava ao mundo um modelo revolucionário: a V-Rod. Além do design futurístico, o modelo foi o primeiro da história da marca norte-americana a ser equipado com motor refrigerado a água.


Fonte texto: www.moto.com.br
Imagens: http://g1.globo.com/ newsmotorcycles1 / olavosaldanha.wordpress.com / 



segunda-feira, 23 de março de 2015

Henry Ford, um homem que mudou o mundo



A produção de automóveis não foi mais a mesma depois
que Ford, um pioneiro, implantou seus métodos e tecnologias


Henry Ford foi o mais famoso criador de veículos de todos os tempos. É conhecido sobretudo pela criação de uma nova forma produtiva, a linha de montagem em série, que permitiu diminuir em muito o custo de seus automóveis e transformar seu carro mais conhecido, o Modelo T, naquele que deu rodas ao mundo.
Suas ideias modificaram todo o pensamento da época, desenvolvendo a mecanização do trabalho, a produção em massa, a padronização do maquinário, do equipamento e dos produtos e a política de metas. Esse sistema produtivo também é conhecido como fordismo. Outra importante ideia de Ford era a de que o pagamento de um salário substancial para os trabalhadores aumentaria seu poder de compra, criando um movimento econômico cíclico.
Considerado um dos mais polêmicos industriais da história, Henry nasceu em 30 de junho de 1863 em uma fazenda onde hoje fica a cidade de Dearborn, próxima a Detroit, no estado de Michigan, nos Estados Unidos. Sua trajetória com motores iniciou-se na fazenda da família, sendo o responsável pelos reparos nas máquinas. Abandonou os estudos na quinta série e com 12 anos, em uma estrada perto da fazenda, teve seu primeiro contato com um locomóvel (como eram chamados os veículos a vapor), fabricado pela Nichols, Shepard & Company.
Em 1879 foi trabalhar como aprendiz de operador de máquinas em Detroit, primeiro na James F. Flower & Bros. e depois na Detroit Dry Dock Co. Três anos depois voltou para a fazenda, operando motores portáteis a vapor da Westinghouse, que logo o contratou para cuidar do conserto e montagem de locomóveis. Nesse período, Ford estudou contabilidade. Em 1885, trabalhando como mecânico das oficinas da Eagle Motor Works, começou a se interessar por motores a explosão.

 
Henry Ford e seu primeiro carro de corridas, o Sweepstakes; à direita, com oQuadricycle de 1896; e no alto, junto de seu maior sucesso, o Modelo T

Ford assumia em 1891 o lugar de engenheiro maquinista na Edison Illuminating Company, de Detroit, e dois anos depois era promovido a engenheiro chefe. No Natal, com a ajuda de sua esposa Clara, pôs seu primeiro motor para funcionar — na cozinha de casa. Os experimentos culminaram em 1896 com a conclusão de seu próprio veículo, o Ford Quadricycle, que ele dirigiu em teste em 4 de junho. O carro tinha dois lugares, motor de dois cilindros horizontais, potência de 4 cv, transmissão de duas marchas e velocidade máxima de 30 km/h. Usava suspensão com molas helicoidais, rodas de bicicleta com pneus de borracha maciça e pesava 225 kg. Para dirigi-lo pela cidade, precisou de uma licença especial do prefeito.
No mesmo ano, Ford foi apresentado a Thomas Alva Edison, que o encorajou a seguir com seus experimentos. Vendeu o carro, mas o compraria de volta mais tarde, e projetou outro, pronto em 1898. Financiado pelo capital do barão da madeira de Detroit, William H. Murphy, ele fundou a Detroit Automobile Company em 5 de agosto de 1899. No entanto, os carros produzidos eram mais caros e de qualidade inferior ao que Ford desejava, e a empresa fechou em janeiro de 1901 após apenas 12 unidades.

Com uma empresa de 12 sócios, Henry Ford projetou um carro barato, o Modelo A, com motor bicilíndrico, mas as vendas fracas quase levaram a empreitada a um fim

Em outubro seguinte, com a ajuda de Harold Wills, Henry construía um carro de corridas com 26 cv — o Sweepstakes —, com o qual vencia já na estreia do modelo nas pistas, em Grosse Point, Michigan. E incentivava Murphy e outros investidores a formar a Henry Ford Company, o que acontecia no mês seguinte, com Ford como engenheiro chefe. No ano seguinte, Murphy contratava Henry Martin Leland como consultor, o que levou Ford a deixar a companhia — rebatizada Cadillac, pois Henry não permitiu o uso de seu sobrenome. O carro projetado por Ford, recebendo um motor desenvolvido por Leland, foi lançado como Cadillac Type A.
Junto ao campeão de ciclismo Tom Cooper, Ford produziu dois carros de corrida, o 999 — em homenagem à locomotiva recordista mundial de velocidade Empire State Express 999 — e o Arrow, com enorme motor de quase 19 litros de cilindrada. Barney Oldfield, que nunca havia dirigido, aprendeu a tarefa ensinado por Ford e, pouco depois, levava o 999 a uma vitória na Copa de Desafio dos Fabricantes. Com o sucesso, Ford recebeu o financiamento de Alexander Malcolmson, um negociante de carvão, e formaram a Ford & Malcolmson para fabricar automóveis.

 
O 999, modelo de competição com enorme motor de 19 litros, e o Modelo A
de 1903 (à direita), primeiro Ford produzido, com motor de dois cilindros

Henry Ford projetou um carro barato, eles alugaram uma fábrica e contrataram a indústria dos irmãos Dodge para fornecer as peças. Fundada em 16 de junho de 1903, a empresa tinha 12 sócios. O primeiro carro — o Modelo A, com motor bicilíndrico vertical — lembrava muito o Cadillac Type A. As vendas fracas quase levaram a empreitada a um fim, mas Malcomson e outros investidores convenceram os Dodges a ficar com uma porção da Ford Motor Company.
Enquanto isso, Henry estabelecia recorde mundial de velocidade com o Arrow de 50 cv, ao atingir 147 km/h sobre um lago coberto de gelo. A corrida foi feita com um mecânico que ficava lubrificando os mancais com o carro em movimento. Ele criou em paralelo a Ford Manufacturing Company. Seu gerente de vendas, James Couzens, ajudou a criar uma rede de 450 revendas de automóveis — até então eles eram vendidos em bicicletarias e outros tipos de comércio.
Em 1904, Gordon McGregor procurava Henry para solicitar a abertura de uma fábrica no Canadá. A Ford entrou com 51% do capital, o restante ficando com os canadenses, que ganhavam o direito a explorar o resto do então império britânico, exceto a Grã-Bretanha. A produção lá começava com o Modelo C. Dois anos mais tarde, a Ford lançava o Modelo K, de luxo, com motor de 40 cv — um fracasso comercial, assim como seu antecessor Modelo B. As falhas em conquistar o mercado de carros de luxo levaram Ford a decidir investir em modelos populares.
Foi o que levou ao Modelo T, vigésimo projeto da empresa. As ideias principais eram rabiscadas por Henry em um quadro negro. O projeto se iniciou em 1907 e o carro foi apresentado em 1º de outubro de 1908, com produção em Piquette Avenue. Foi um sucesso sem igual, chegando a ter 57% de todo o mercado mundial de automóveis.

 
O Ford Modelo T, que deu rodas ao mundo; foram produzidos mais de 15 milhões
deles em 19 anos — muitos em cor preta, por ser a tinta de secagem mais rápida

O T trazia inovações como o volante no lado esquerdo, o que foi logo copiado por todas as companhias. O motor e o câmbio eram fechados, com os quatro cilindros fundidos em um bloco sólido e o cabeçote separado; o combustível podia ser tanto gasolina quanto álcool. A suspensão usava duas molas semielípticas e o carro era alto o suficiente para rodar em áreas rurais. A transmissão planetária era acionada por três pedais e existiam dois sistemas de freios, um na transmissão e um nas rodas traseiras. O acelerador era por uma barra atrás do volante; a carroceria usava aço vanádio em sua construção.
O carro era simples de dirigir e, o mais importante, sua manutenção era barata. As peças eram então construídas na fábrica dos irmãos Dodge em Leasing. O preço no lançamento era de US$ 825 (o equivalente a cerca de R$ 21.500 hoje), mas caía todo ano e, em 15 anos, havia descido a US$ 260. Ford criou um sólido sistema de publicidade em Detroit para garantir que cada jornal transmitisse notícias e anúncios sobre o novo produto. As vendas subiram rápido — vários anos tiveram 100% de aumento em relação ao ano anterior.

Ford mais do que duplicou o salário da maioria dos funcionários; com isso, no lugar da constante rotatividade, atraiu e manteve os melhores mecânicos e reduziu os custos

Até então, os fabricantes de carros tinham que pagar royalties para o dono da patente norte-americana de automóvel, um advogado de nome Selden. Ford então construiu um veículo com as mesmas especificações do feito por Etienne Lenoir, em 1862, e o apresentou para refutar a patente de Selden. Assim venceu a ação movida contra este em 1911, liberando os fabricantes do pagamento de direitos de patente. Acreditando na expansão global da companhia, abriu uma unidade de montagem no Reino Unido em 1911 e, assim como no Canadá, logo se tornou o maior produtor de automóveis daquele país.
Com o objetivo de baratear ainda mais o Modelo T, Ford construiu a fábrica de Highland Park com alta integração vertical, ou seja, quase tudo era feito na própria unidade. Lá Henry planejava a produção em massa com a linha de montagem, o que começou em 1913. Pela primeira vez, as máquinas ficavam na sequência de produção, não por tipo de equipamento. Foi ajudado também por Walter Flanders no processo de melhorias na eficiência produtiva, assim como no projeto das máquinas-ferramenta.


 
Da esquerda para a direita, a linha de montagem do Modelo T, inaugurada
em 1913; o carro no Egito e a unidade de número cinco milhões do modelo

Diz-se que a ideia da linha de montagem partiu de uma visita de Henry a um abatedouro, mas ele inverteu o processo produtivo: enquanto no abatedouro existe uma linha de desmontagem, na qual em cada estação de trabalho é retirado um pedaço do animal, na indústria em cada estação é acrescentada uma peça ao veículo, com a ajuda de esteiras de movimentação. No mesmo ano, Ford tentou colocar um Modelo T na corrida 500 Milhas de Indianápolis, mas as regras exigiam a adição de  450 kg ao carro. Ele desistiu da prova e, logo depois, deixou as competições em definitivo.

Cinco dólares ao dia

Henry Ford foi um pioneiro do capitalismo do bem-estar social, ao melhorar a situação de seus trabalhadores. Em 5 de janeiro de 1914, passou a oferecer o pagamento de US$ 5 por dia, o que mais do que duplicou o salário da maioria dos funcionários. O ato foi muito rentável: no lugar da constante rotatividade de empregados, que necessitava contratar três homens por ano por posto de trabalho, a Ford atraiu e manteve os melhores mecânicos de Detroit, aumentou sua produtividade e reduziu os custos de treinamento. Henry chamou isso de “salário de motivação”. Também reduziu a duração do dia de trabalho de 9 para 8 horas.
Outra inovação para o período foi a repartição de uma parte do controle acionário para funcionários com seis meses ou mais de empresa e que seguissem as condutas do Departamento Social, cujos 50 investigadores verificavam casos de excesso de bebida, jogatina e fumo — o próprio Henry escreveu um livro sobre os perigos de fumar. O dia de U$ 5 o fez impopular entre alguns empresários e, recebendo ameaças de assassinato, passou a andar com seguranças.
Com os aperfeiçoamentos produtivos, o tempo de produção do Modelo T, que de início era de 12 horas e meia, passava a só 93 minutos. Para diminuir o tempo de fabricação, o carro passou a ser disponível só na cor que permitia secagem mais rápida — preto. A secagem dava-se em uma sala com o auxílio de jatos de ar quente. Seus oponentes ironizavam que, segundo Henry, “o comprador de um Modelo T pode ter o carro na cor que desejar, desde que seja preto”. Não importava: as vendas ultrapassaram 250.000 unidades em 1914 e a Ford passou a oferecer, se as vendas superassem 300.000 unidades anuais, um reembolso aos compradores — o que acabou acontecendo.


A fábrica do Modelo T em Piquette Avenue, até 1910; a produção em Highland

Park, em 1926, e Henry no T de 15 milhões, com o filho Edsel ao volante

Ford era um pacifista contra a guerra. Em 1915, um ano depois do início da Primeira Guerra Mundial, Rosika Schwimmer obteve a ajuda de Henry para financiar uma viagem de navio para a Europa para 170 proeminentes líderes pacifistas, uma espécie de missão de paz. Ele dizia: “O dinheiro é a coisa mais inútil do mundo; não estou interessado nele, mas sim no que posso fazer pelo mundo com ele”. Ford conversou com o presidente norte-americano Woodrow Wilson sobre a missão, mas não obteve apoio. Seu grupo partiu rumo à neutra Suécia e à Holanda para se encontrar com ativistas da paz nesse último país. Ridicularizado, teve que deixar o navio logo na Suécia.
Apesar da posição de Henry, a fábrica Ford no Reino Unido, produtora de carros, tratores e motores de avião, com a guerra passou a produzir o motor Liberty para aviões militares e barcos antissubmarino. Henry também criou a primeira linha de montagem para caminhões, lançando o TT (T Truck) em 1917.
No ano seguinte, o presidente Wilson pediu a Ford para que se candidatasse ao Senado como um democrata. Ele concorreu como um pacifista apoiador da proposta Liga das Nações. Em dezembro, transferia a presidência da Ford Motor Company para seu filho Edsel, embora retendo a autoridade de decisão final. Henry fundou outra empresa, Henry Ford and Son, levando para ela os melhores funcionários. O objetivo era assustar os demais acionistas da Ford Motor Company para que vendessem suas ações. Deu certo, e Henry e Edsel compraram todas as ações restantes de outros investidores, trazendo à família exclusivo domínio sobre a companhia.
Em 1919 o Modelo T passava a vir com partida elétrica. Três anos depois a produção superava dois milhões de unidades anuais. Em 1924, a fábrica de Highland Park era aberta para turistas. Mais dois anos e, com o aperfeiçoamento dos compostos de pintura, o carro ganhava outras cores. Defendido por Henry, o T foi mantido em produção até 26 de maio de 1927, quando completou 15.007.034 unidades nos EUA 19 anos (15.484.781 no total mundial). O recorde permaneceu por 45 anos até que o Volkswagen o quebrasse, em 1972, depois de 29 anos de produção. O T seria eleito décadas mais tarde o Carro do Século. 
 
O Modelo A substituiu o T e vendeu quatro milhões de unidades; sua fabricação
era verticalizada ao extremo, pois Ford tentou produzir até a borracha dos pneus 

Melhor que qualquer outro

Apesar de seu esforço pela melhoria de vida dos trabalhadores, Henry era contra os sindicatos — achava que eram muito influenciados por alguns líderes, cujas ideias não raro mais prejudicavam que ajudavam os trabalhadores. Também acreditava que os líderes sindicais desejavam crises perpétuas como maneira de manter seu poder sobre os trabalhadores. Foi formado então pelo Departamento Social um sistema de intimidação aos sindicalistas que tentavam agremiar os funcionários de Ford, o que levou a batalhas entre seguranças e sindicalistas. Edsel achava que algum acordo deveria ser feito, mas Henry recusava. A Ford foi a última empresa a reconhecer o sindicato dos trabalhadores da indústria automobilística, o UAW, apenas devido à posição de Clara, mulher de Henry.
Em 4 de fevereiro de 1922, Ford comprou a Lincoln. Pela aquisição, declarou: “Já construímos mais carros que qualquer outro, e agora vamos construir um carro melhor que qualquer outro”. Pela metade da década, as vendas do Modelo T começaram a declinar — outros fabricantes ofereciam planos de financiamento para seus carros, que incluíam características mecânicas mais modernas e estilos não disponíveis no T. Apesar dos estímulos de Edsel, Henry recusava-se a incorporar tais evoluções e a criar um plano de crédito.

O desempenho do Ford V8 rendeu a Henry um agradecimento do bandido Clyde Barrow por ter criado o veículo que o permitiu por diversas vezes fugir da polícia…

A companhia de aviões Stout Metal Airplane Company era adquirida em 1925 por Ford, que desenvolveu o avião Ford 4AT Trimotor — chamado de Ganso de Lata, pela construção metálica ondulada com uma liga chamada Alclad, que combinava a resistência à corrosão do alumínio com a força do duralumínio. O Trimotor foi o primeiro bem-sucedido avião de passageiros dos EUA. Foram construídos 199 deles até 1933, quando a Ford Airplane Division encerrou suas atividades devido às poucas vendas durante a Grande Depressão.
Na época Henry também se envolveu em uma polêmica ao incentivar um jornal, o The Dearborn Independent, que publicava artigos antissemitas. Apesar disso, ele nunca discriminou funcionários e fornecedores judeus e condenava a violência contra eles. Foi também um dos primeiros empresários norte-americanos a empregar negros. Nos anos 20, Ford construiu instalações na África do Sul, Argentina, Austrália, Brasil, Filipinas, França, Índia e México.

 
Henry na aquisição da Lincoln, em 1922, e 10 anos depois junto ao primeiro
motor V8 de grande produção, que notabilizou o Ford V8 pelo desempenho

Por volta de 1926, o enfraquecimento das vendas do Modelo T enfim convenceu Henry a fazer um novo carro, que ele projetou em 90 dias com um grande número de técnicos, deixando o desenho da carroceria para seu filho, Edsel. O resultado foi o Modelo A, produzido de 1927 a 1931 em mais de quatro milhões de unidades, com 50.000 pedidos de compra no dia de apresentação. Foi a maior campanha publicitária feita até então, com cinco dias de anúncio de página inteira em 2.000 jornais do país. Entre o fim de produção do Modelo T e a introdução do A, a fábrica ficou sete meses parada.
Quando se iniciou a produção do Modelo A, a fábrica de River Rouge era o maior complexo industrial do mundo, com 93 prédios e uma área construída de 1,5 milhão de metros quadrados. Tinha forte integração vertical, fazendo até o próprio aço. Ford objetivava produzir um veículo a partir do zero, sem dependência — mesmo a borracha dos pneus ele desejava produzir. Para isso, montou uma enorme plantação de seringueiras para a produção de borracha na Amazônia brasileira, com uma vila chamada de Fordlândia, o que acabou terminando em prejuízo. 
Ford tinha bastante interesse na história norte-americana e tentou transformar Sudbury, Massachusetts, em uma vila histórica. O plano não deu certo, mas em 28 de outubro de 1929 foi aberto o Museu Henry Ford (na época Instituto Edison) em Greenfield Village, onde funciona até hoje. No mesmo ano, aceitou o convite de Joseph Stalin para construir uma fábrica — a NNAZ, hoje GAZ — na cidade de Gorky (atual Nizhny Novgorod), enviando engenheiros norte-americanos para instalá-la.
Henry enfim superou em 1930 sua oposição a companhias de financiamento, fazendo da Universal Credit Corporation de Ford a principal financiadora de veículos do mundo. Em 1930 começava a construção da fábrica na Alemanha e, no ano seguinte, comemorava-se o Ford de número 20 milhões. Depois do Modelo A, a empresa adotou um sistema de mudança anual de modelo, estratégia criada pela General Motors nos anos 20.
A concorrência ao Modelo A começou a apertar com a chegada do Chevrolet de seis cilindros. Henry decidiu então lançar como resposta o primeiro carro com motor V8 confiável e com preço competitivo. Seu desempenho era tão surpreendente para a época que Henry chegou a receber uma carta de agradecimento do famoso bandido Clyde Barrow, da dupla de assaltantes Bonnie e Clyde, agradecendo-o por ter criado o veículo que o permitiu por diversas vezes fugir da polícia… Henry chegou a construir dois protótipos de motor de cinco cilindros, mas o projeto foi abandonado.

 
Henry Ford: a mecanização do trabalho para a produção em massa, conhecida
como fordismo, foi uma de suas contribuições para o mundo moderno

Uma série de derrames no fim dos anos 30 deixou Ford debilitado. Ele passou a ser mais figurativo na empresa, com decisões tomadas por outros. Mesmo assim, levou adiante um projeto que iniciara três décadas antes, testando materiais agrícolas na produção de automóveis. Testou a soja em tintas, borrachas e óleo para amortecedores. Convertia-a em plástico, usado em porta-luvas, manoplas de câmbio, botões de buzina, pedais, painéis de instrumentos e tampa de porta-malas.
Construiu um carro com carroceria toda de plásticos derivados da agricultura, com 14 peças fixadas a um chassi tubular, que pesava dois terços de um similar de aço. Ao exibir o protótipo, em 1941, comprovou a resistência da carroceria dando machadadas. Entre as fibras usadas estava até a do cânhamo da maconha — do qual se extraia o óleo para o motor do carro experimental funcionar. Henry sempre foi um prolífico inventor e ao todo teve 161 patentes registradas.
Ele opôs-se à entrada dos EUA na Segunda Guerra Mundial, continuando a ter negócios com os alemães até a declaração do conflito. Acabou tendo de construir na fábrica de Willow Run os bombardeiros B-24, de outubro de 1942 em diante, e no total produziu 9.000 deles. Após a morte de Edsel de câncer, em 1943, Henry reassumiu o controle nominal da empresa, mas na verdade ela era dirigida por Charles Sorensen e Harry Bennett. Foi quando a empresa começou a declinar. A administração do presidente Franklin Roosevelt considerou uma estatização da Ford, pelo menos para garantir a produção bélica.
Henry Ford II assumiu a presidência no lugar do avô Henry, doente, em setembro de 1945 e conseguiu restabelecer a empresa. O pioneiro Henry faleceu em Dearborn no dia 7 de abril de 1947, aos 83 anos. O sétimo homem mais rico de todos os tempos, em valores atualizados, deixou a maior parte de sua fortuna para a Fundação Ford, mas providenciou o controle permanente da empresa por sua família.
Fonte: http://bestcars.uol.com.br/ Texto: José Geraldo Fonseca